Daily Line: As sepulturas da Normandia
POSSUI SPOILER DO LIVRO 8 | Leia outros em Trechos da Diana
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Deviam ser oito horas da manhã quando chegamos em Freehold, onde a Tennent Church deveria ser estabelecida como o hospital principal. Era um prédio grande, no meio de um enorme, imenso cemitério, um acre ou mais de terreno cujas lápides eram tão distintas quanto, sem dúvida, seus proprietários tinham sido em vida. Ali não havia corredores limpos de cruzes brancas uniformes. Comecei a refletir sobre as sepulturas da Normandia e me perguntei se aquelas filas de mortos sem rostos poderiam significar uma espécie de limpeza pós-morte às custas da guerra ou se sua intenção era a de acentuar uma contabilidade solene às filas intermináveis de cruzes e fileiras de indigentes.
Mas eu não tinha muito tempo para pensar. A batalha já havia começado – em algum lugar – e já havia feridos chegando, alguns homens sentados à sombra de uma grande árvore ao lado da igreja, mais vindo pela estrada, alguns cambaleando com a ajuda de amigos, outros sendo carregados em macas, ou nos braços de alguém. Meu coração disparou diante daquela visão, mas eu tentei não procurar Jamie ou Ian. Se eles estivessem entre os primeiros feridos, eu logo saberia.
Havia uma agitação perto do pórtico da igreja onde as portas duplas tinham sido abertas para facilitar a passagem, e atendentes e cirurgiões iam e vinham apressadamente, mas de forma organizada, até o momento.
“Por que não vai ver o que está acontecendo?”, sugeri à Denzell. “Eu e as meninas vamos descarregar as coisas”.
Ele fez uma pausa longa o suficiente para desatrelar suas próprias mulas e atar suas pernas umas nas outras para que não pudessem fugir e, depois, dirigiu-se rapidamente à igreja.
Eu encontrei os baldes e mandei Rachel e Dottie saírem atrás de um poço. O dia já estava desconfortavelmente quente; iríamos precisar de muita água, de um jeito ou de outro.
Clarence demonstrava um forte desejo de ir juntar-se às mulas de Denny que pastavam entre as lápides, sacudindo a cabeça fortemente contra a corda e gritando de aborrecimento.
“Tudo bem, tudo bem, tudo bem eu disse”, correndo para desfazer as correias e erguer os fardos. “Aguente… oh, Deus.”
Um homem cambaleava em minha direção, fazendo pressão sobre os joelhos e oscilando vertiginosamente. A lateral do seu rosto estava preta e havia sangue na frente do seu uniforme. Eu larguei o feixe de estacas e corri para pegá-lo prelo braço antes que tropeçasse em uma lápide e caísse de cara no chão.
“Sente-se,” eu disse. Ele parecia estar bastante atordoado e era como se não conseguisse me ouvir, mas quando o puxei pelo braço, ele caiu, deixando os joelhos relaxarem abruptamente e quase me levando com ele quando pousou em uma lápide em homenagem a um certo Gilbert Tennent.
Meu paciente cambaleava como se estivesse prestes a cair, mas, no entanto, um teste rápido não apontou ferimentos significativos; o sangue no casaco vinha do seu rosto, onde a pele enegrecida estava inchada e partida. Não se tratava apenas de fuligem, a pele estava realmente queimada, a carne subjacente também estava queimada e meu paciente cheirava terrivelmente como um porco assado.
Eu fiz um esforço para não vomitar e parei de respirar pelo nariz. Ele não respondia minhas perguntas mas olhava fixamente para os meus lábios, e parecia estar lúcido apesar de continuar balançando. A ficha finalmente caiu.
“Ex… plo… são?” eu murmurei com cuidado exagerado e ele assentiu vigorosamente e, depois, parou repentinamente, balançando tanto que precisei agarrá-lo pela manga para mantê-lo de pé.
Pelo uniforme, era da artilharia. Então, alguma coisa grande havia explodido perto dele – um morteiro, ou um canhão? E não tinha apenas queimado seu rosto até os ossos, mas também tinha, provavelmente, estourado seus tímpanos e abalado o equilíbrio do seu ouvido interno.
Eu assenti com a cabeça e coloquei suas mãos na pedra onde estava sentado, para mantê-lo no lugar enquanto terminava de descarregar Clarence – que estava fazendo um estardalhaço de tanta frustração. Eu deveria ter percebido logo que aquele soldado de artilharia estava surdo, já que ele parecia não estar notando o barulho. Eu amarrei suas pernas e o deixei livre para juntar-se às mulas de Denny na sombra. Eu busquei o que precisava dentro dos pacotes e comecei a fazer o pouco que podia para ajudar o homem ferido, o que consistia principalmente em molhar uma toalha em soro fisiológico e aplicá-la no seu rosto como um cataplasma, para remover o máximo de fuligem que pudesse sem esfregar.
(Imagem Wikimedia Commons, sob licença da Creative Commons. Obrigada.)
Fonte: Diana Gabaldon
Data de publicação: 07/06/2019
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