Livro vs Série – 5×03 – Free Will
Sassenachs e Highlanders, é de livre e espontânea vontade que eu voz digo que terceiro episódio desta quinta temporada, “Free Will”, conseguiu superar expectativas com uma ótima adaptação da história original. Sem mais delongas, vamos iniciar a nossa análise comparativa, mas já aviso, foi um episódio muito fiel ao livro.
De início, vale destacar que não houve nenhuma mudança narrativa drástica em relação ao material original. No livro, a preparação para partida foi um pouco mais longa, com cerimônia da cruz de fogo ocorrendo nesse ponto, além de contar com a presença de boa parte dos homens convocados para a milícia em Ridge. Já comentamos sobre isso, de como a série juntou dois eventos do livro, o discurso na fogueira do grande encontro e o da cruz de fogo. Dali, Jamie e companhia partem e vão convocando novos milicianos pelo caminho.
Neste ponto, tivemos uma pequena mudança, resumindo um pouco a história dos irmãos Beardsley. No livro, durante a noite do acampamento, temos o surgimento repentino de Josiah Beardsley, que assusta alguns dos vigias, ainda sem seu irmão. A diferença aqui é o que jovem está receoso de contar toda sua história e tenta fugir para resgatar o irmão, porém Jamie o segue, descobre a verdade e acaba ajudando Josiah no resgate de seu gêmeo. Depois os três retornam para o acampamento, e sim Keziah sem calças pelo mesmo motivo de não querer perturbar os gatinhos do celeiro. Então, Jamie divide as tropas, indo com a Claire a casa dos Beardsley e mandando Roger seguir com os homens. Mas nosso highlander favorito não vai lá para comprar os contratos de serviço dos garotos, vai para descobrir se alguém está atrás deles, ou se estão em segurança. A série resumiu muito bem a história, adequando-a para a narrativa da TV. Confira o trecho que Jamie conta do ocorrido para Claire:
“– Então, você decidiu ir até a fazenda com ele em segredo e ajudá-lo no resgate.
Meu nariz também estava escorrendo por causa do frio. Peguei meu lenço com uma das mãos, confiando que a égua, a sra. Piggy, não nos catapultaria montanha abaixo enquanto eu assoasse o nariz. Olhei para Jamie sobre o lenço. Ele ainda estava com o nariz vermelho, suado e com cara de doente, mas suas maçãs do rosto estavam coradas por causa do sol da manhã, e ele parecia bastante bem-disposto para um homem que havia passado a noite toda na mata fria.
– Foi divertido?
– Ah, sim, foi. Há anos não fazia algo assim. – Os olhos de Jamie se encolheram em triângulos azuis quando ele riu. – Lembrei de quando invadimos as propriedades dos Grants com Dougal e seus homens, quando eu era garoto. Deslocar-se em silêncio no escuro, entrar no celeiro sem emitir som… Cristo, tive que me conter a tempo antes de roubar a vaca. Ou pelo menos teria pegado, se houvesse uma.
– Você é um completo bandido, Jamie – falei, rindo.
– Bandido? – perguntou ele, levemente ofendido. – Sou um homem muito honesto, Sassenach. Ou pelo menos sou quando posso ser – disse ele, olhando rapidamente para trás para ter certeza de que não estávamos sendo ouvidos.
– Ah, você é totalmente honesto – garanti a ele. – Honesto demais para o seu próprio bem, na verdade. Só não obedece muito à lei.
Esse comentário pareceu desconcertá-lo um pouco, pois ele franziu o cenho e emitiu um grunhido gutural que podia ser tanto um som escocês de discordância quanto uma tentativa de livrar-se do muco. Ele tossiu, puxou as rédeas e, de pé nos estribos, acenou com o chapéu para Roger, que estava um pouco distante de nós,
encosta acima. Roger acenou em resposta, e virou o focinho do cavalo em nossa direção.
Parei meu cavalo ao lado do de Jamie e soltei as rédeas em seu pescoço.
– Vou pedir a Roger que conduza os homens até Brownsville – explicou Jamie, ajeitando-se na sela –, enquanto eu vou falar com os Beardsleys sozinho. Você vem comigo, Sassenach, ou prefere ir com Roger?
– Ah, vou com você – respondi, sem hesitar. – Quero ver como são esses Beardsleys.
Jamie sorriu e afastou os cabelos com uma das mãos antes de colocar o chapéu. Ele usava os cabelos soltos para cobrir o pescoço e as orelhas e protegê-los do frio, e eles reluziam como cobre derretido ao sol da manhã.
– Foi o que achei. Mas cuidado com o rosto – disse ele, em um alerta meio brincalhão. – Não fique boquiaberta nem faça cara de boba quando eles contarem sobre o servo que desapareceu.
– Cuide você do seu rosto – retruquei, meio irritada.”
Dali, nosso casal parte para a casa dos Beardsleys e encontram tudo aquilo. Sim, foi uma excelente adaptação. A principal mudança aqui é que eles não passam nenhuma noite na casa. Após entender toda a situação e Jamie atender ao último desejo do sr. Beardsley, eles partem para Brownsville, para encontrar o resto da milícia. A atual sra. Beardsley, que no livro é fanha devido à falta de dentes, segue com eles, levando junto suas amadas cabras. O parto e sumiço da nova mãe ocorrem no meio da mata, onde acompanhamos também um ataque de pantera, que leva uma cabra e fere o bode, que sobrevive graças ao atendimento dado por Claire. Outra diferença é que sra. Beardsley tem sua bebê sozinha e então parte em seguida, deixando a pequena com o casal Fraser. A série fez uma boa adaptação, amarrando bem a história, chegando ao mesmo destino com um caminho pouco diferente.
Confira o trecho em que Jamie e Claire acordam e encontram a bebê:
“Acordei de repente, com os ecos dos gritos deles ainda ressoando nos meus ouvidos. Estava deitada em um monte de capas e cobertores, os membros de Jamie pesando sobre os meus, e uma neve fina e gelada caindo sobre os pinheiros. […]
Acordando assustado, Jamie fez um movimento brusco, rolou instintivamente para longe do monte de capas e cobertores e se agachou, com os cabelos despenteados e os olhos à procura do perigo.
– O que foi? – perguntou ele, rouco. Pegou sua faca que estava embainhada próxima dele, no chão, mas eu levantei uma das mãos para impedi-lo de se mover.
– Não sei. Um barulho. Ouça!
Ele ergueu a cabeça, ouvindo, e eu vi sua garganta se movimentar dolorosamente quando ele engoliu em seco. Eu não conseguia ouvir nada além da neve caindo e não via nada além dos pinheiros gotejantes. Mas Jamie ouviu alguma coisa – ou viu; seu rosto mudou de repente.
– Ali – disse ele baixinho, assentindo para algo atrás de mim. Eu fiquei de joelhos e vi algo que parecia um monte de trapos a alguns metros dali, ao lado das cinzas de uma fogueira extinta. Ouvi o grito de novo, inconfundível dessa vez.
– Jesus Cristo. – Eu mal me dei conta de que estava falando quando me lancei em direção à trouxa de panos. Comecei a afastar peça por peça. Estava vivo – eu o ouvira gritar –, mas ao mesmo tempo estava inerte, quase sem fazer peso na curva do meu braço.
O rostinho e o crânio sem cabelos estavam branco-azulados, os traços crestados como a casca de uma fruta de inverno. Pousei a mão aberta sobre o nariz e a boca e senti um calor leve e úmido contra a minha pele. Sobressaltado com meu toque, a boca se abriu em um berro, e os olhos oblíquos se fecharam com força, isolando do lado de fora o mundo ameaçador.
– Santo Deus. – Jamie se benzeu depressa. Sua voz não passava de um sussurro rouco por causa do catarro; ele pigarreou e tentou de novo, olhando ao redor. – Onde está a mulher?
Chocada com o aparecimento do bebê, eu não tinha parado para pensar de onde ele poderia ter vindo, nem havia tempo para isso agora. O bebê se remexeu um pouco nos panos, mas as mãozinhas estavam frias como gelo, a pele azulada e roxa de frio.
– Não importa agora… pegue o meu xale, Jamie. O coitadinho está quase congelando. – Desamarrei com uma das mãos os laços do meu corpete; era um antigo modelo que se abria na frente e que eu usava em viagens porque era mais fácil de vestir. Afrouxei o espartilho, o cordão do meu vestido e pressionei a criaturinha gelada contra meus seios nus, minha pele ainda quente do sono. Uma rajada de vento soprou neve na pele exposta do meu pescoço e dos meus ombros. Puxei o vestido depressa por cima da criança e me curvei, tremendo. Jamie jogou o xale sobre os meus ombros e em seguida nos envolveu, abraçando-nos com força, como se quisesse forçar o calor de seu corpo para dentro da criança.
Seu calor era considerável; ele estava ardendo em febre.
– Meu Deus, você está bem? – Olhei para ele, que estava com o rosto pálido e os olhos vermelhos, mas firme.
– Sim, estou. Cadê ela? – perguntou de novo, rouco. – A mulher.
Ela havia partido, evidentemente. As cabras estavam unidas sob o abrigo na margem; vi os chifres de Hiram aparecendo acima das costas das cabras. Uma meia dúzia de pares de olhos amarelos nos observava com interesse, lembrando-me dos meus sonhos.
O lugar onde a sra. Beardsley havia se deitado estava vazio; nada além do mato amassado como prova de sua presença. Ela devia ter se afastado para poder dar à luz; não havia sinal do parto perto do fogo.
– É dela? – perguntou Jamie. Eu ainda podia ouvir a congestão em sua voz, mas o leve sibilo em seu peito havia diminuído, o que era um alívio.
– Deve ser. De onde mais ele poderia ter saído?
Minha atenção estava dividida entre Jamie e a criança, que havia começado a se remexer, com movimentos como os de um caranguejo contra minha barriga, mas olhei ao redor de nosso acampamento improvisado. Os pinheiros permaneciam escuros e silenciosos sob a neve que caía; se Fanny Beardsley tivesse entrado na floresta, não havia rastros de agulhas amassadas que evidenciassem sua passagem. Cristais de neve cobriam os troncos das árvores, mas não em quantidade suficiente para cobrir o chão; não havia chance de encontrarmos pegadas.”
Uma última diferença, dessa vez técnica. Jamie repara que bebê nasceu com pela escura, o que indicava que o pai era negro. Em geral recém nascidos dão indícios de sua ascendência pela mancha mongólica, que é uma mancha escura na região das nádegas e costas, que é bastante comum em asiáticos e negros. No livro é assim, tanto que Jamie pensa que o bebê se machucou devido a mancha, então a Claire explica a ele. Uma adaptação realizada provavelmente por conta da logística de se encontrar um bebê com as características necessárias. Confira o trecho sobre esse tema:
“A menininha parecia saudável, mas pequena; não era maior do que uma boneca grande, com a barriga cheia de leite. Essa era a dificuldade imediata; pequena daquele jeito, sem gordura corporal para protegê-la, morreria de hipotermia em pouco tempo, a menos que a mantivéssemos aquecida e alimentada.
– Não deixe que ela pegue friagem. – Coloquei as mãos nas minhas axilas para esquentá-las, preparando-me para pegar a criança.
– Não se preocupe, Sassenach. Vou limpar o traseiro dela e então… – Ele parou, franzindo o cenho. – O que é isto, Sassenach? Acha que ela está machucada? Será que a mulher a deixou cair?
Eu me inclinei para olhar. Ele ergueu os pés do bebê com uma das mãos, o pano sujo na outra. Logo acima do traseiro, havia uma mancha azul-escura, como um hematoma.
Não era um hematoma. Mas era uma explicação.
– Ela não está machucada – garanti a ele, pegando outro dos xales da sra.
Beardsley para proteger a cabeça carequinha da filha dela. – É uma mancha mongólica.
– Uma o quê?
– Quer dizer que a criança é negra – expliquei. – Africana, quero dizer, parcialmente. – Jamie piscou, perplexo, e então se inclinou para espiar dentro do xale, franzindo o cenho.
– Não, não é. É branca como você, Sassenach.
Era verdade; a criança era tão branca que parecia não ter sangue.
– As crianças negras nem sempre parecem negras quando nascem – expliquei a ele. – Na verdade, com frequência são bastante pálidas. A pigmentação da pele começa a se desenvolver algumas semanas depois. Mas elas costumam nascer com uma leve descoloração da pele na base da espinha… que se chama mancha mongólica.
Ele passou a mão no rosto, afastando flocos de neve que se agarravam a seus cílios.
– Entendi – disse ele, lentamente. – Bem, isso explica em parte, não?
Explicava. O falecido sr. Beardsley, independentemente do que tivesse sido, não era negro. O pai da criança era negro. E Fanny Beardsley, sabendo – ou temendo – que a criança que estava esperando revelaria sua condição de adúltera, pensou que seria melhor abandoná-la e fugir antes que a verdade viesse à tona. Eu me pergunteise o pai misterioso teria algo que ver com o que havia acontecido ao sr. Beardsley, nesse caso.”
Com isso, terminamos nosso comparativo de hoje. Como eu disse, foi um episódio muito fiel, com adaptações que não afetaram a narrativa principal. Eu particularmente fiquei totalmente satisfeita com esse episódio. E você, Sasse, o que achou? Curtiu, faria diferente? Comente!
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